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Novas chaves para decifrar a educação no pós-pandemia

Novas chaves para decifrar a educação no pós-pandemia

JosaneJulião

Josane Julião

Reitora da Hamburger University na América Latina

Até antes da pandemia, para entender a realidade em que vivíamos era utilizado um conceito chamado VUCA – sigla (em inglês) para Volatilidade, Incerteza, Complexidade e Ambiguidade. Ele servia como orientação no ambiente de trabalho para abordagens ágeis e auto-orientadas.

Ele ajudava a conhecer a instabilidade de cada mudança; saber que as incertezas comprometem as previsões; que algumas complexidades não poderiam ser eliminadas; e que os sinais que servem de base para uma estratégia, muitas vezes, são ambíguos. Mas, hoje, este conceito se tornou insuficiente. Os cenários atuais são mais frágeis, sujeitos a mudanças inesperadas e imprevisíveis. As incertezas envolvidas exigem um planejamento mais abrangente, e, para tanto, é preciso lidar com a ansiedade que tudo isso gera.   

A pandemia deixou claro que o jogo mudou – e que seu nome é justamente “Mudança”. Mais sucesso terá quem melhor se adaptar a isso. Ela tem nos ensinado que o mundo não caberá mais nos conceitos criados antes dela para explicá-lo. As empresas já esperam que seus colaboradores entendam que os modos de viver, trabalhar e aprender mudaram. Isso significa que a relação das pessoas com as formas de aprender e de se capacitar para a vida profissional terá de mudar. 

Novo cenário

A realidade, então, tem quatro novas chaves para ser decifrada – reunidas na sigla (em inglês) BANI: Fragilidade, Ansiedade,Não-Linearidade e Incompreensibilidade. Tudo pode mudar a qualquer instante. O estado em que o mundo se encontra, em meio a crises de ordem econômica, ambiental, social e sanitária, gera ansiedade. Não há uma explicação racional imutável para as coisas. E o que não conseguimos entender como indivíduos talvez possa fazer sentido num plano mais amplo, coletivo.  

As competências necessárias para navegar por esta nova realidade têm sido chamadas de Power Skills: o conhecimento formal e técnico se soma à inteligência emocional e às habilidades interpessoais. E a sala de aula, como a conhecíamos até a chegada da covid-19, não basta para que se aprenda como colocar todas essas ferramentas na mesma caixa.

Cada vez mais serão necessárias metodologias ativas – o aluno tem que ser protagonista de seu aprendizado. Para que seja assim, é preciso que o que se vai ensinar esteja inserido em contextos que ele reconheça – como situações reais do dia a dia de trabalho, por exemplo. Desse modo, ele entende a aplicabilidade do que lhe é ensinado. Também aprende que, da solução para um problema, faz parte a sua habilidade em obter apoio, lidar com pessoas, saber encontrar o caminho do meio – exercitar a empatia e a sociabilidade.

Um modelo para essa nova cara que o ensino vai ter pode estar no modelo 70-20-10. Embora tenha sido elaborado nos anos 1990, ele se mostra adequado para a realidade de hoje porque propõe que apenas 10% do conhecimento é adquirido no aprendizado formal. A maior parte (70%) se dá no nível empírico – com a “mão na massa”. Resolver problemas reais dá a dimensão do desafio com que se vai lidar quando o aluno estiver empregado. E 20% se dá de forma relacional e referencial – buscando pessoas que tenham resolvido problemas parecidos.

Esse modelo dá mais espaço para trabalhos aplicados em projetos de vida, que façam mais sentido para o aprendiz. O professor, nesse caso, passa a ser um facilitador do processo – e não mais um “detentor do conhecimento”, que transmite tudo em forma de conceitos abstratos e teorias. Isso se aplica não só para estudantes universitários como para os do ensino médio também.

A Hamburger University, universidade corporativa do McDonald’s, marca operada pela Arcos Dorados em 20 países da América Latina e Caribe, prioriza a aprendizagem ativa (o “active learning”) para resolução de problemas complexos e para desenvolver habilidades de liderança. Por exemplo: com essa abordagem, um pequeno grupo de pessoas se aprofunda no entendimento do problema real em busca de sua causa-raiz. Com o consenso quanto ao desafio a enfrentar, criam um plano de ação e atuam em consequência para implementá-lo. Esse processo promove debates, que invariavelmente proporcionam uma nova perspectiva: as opiniões divergentes, sem que haja imposições, ampliam as possibilidades. O resultado é que todos aprendem com seus erros, se adaptam rapidamente e inovam com sucesso.

Este é apenas um exemplo do que as organizações podem fazer. Mas cada um de nós pode também desenvolver critérios e evoluir na medida de nossa disposição para aprender, respeitar opiniões e colocar em prática soluções. Dessa forma, aprenderemos a mostrar resistência frente ao cenário frágil; a ter empatia e dedicar atenção plena para lidar com a ansiedade que assola o mundo; a buscar mais contextos para nos adaptarmos às mudanças que hoje parecem incompreensíveis. É assim que se dará uma resposta produtiva às questões sociais e econômicas que o mundo enfrenta hoje.